Quem conhece Patrícia Moreira, investigada por praticar ato de injúria racial envolvendo o goleiro Aranha na partida entre Grêmio e Santos, na
última quinta-feira, garante que ela não tem qualquer sinal que a aponte como uma pessoa "racista". É o que garantem amigos negros da menina de 23 anos e que
residem próximos a ela, na zona norte de Porto Alegre. O GloboEsporte.com visitou a região na tarde de sábado e ouviu os vizinhos. A jovem não foi encontrada
para se manifestar.
Lucas da Silva, de 20 anos, faz parte dos amigos que defendem Patrícia. Acha que ela se deixou levar pela "emoção do
momento", afinal o time gaúcho perdia em casa por 2 a 0 na estreia pela Copa do Brasil, nas oitavas de final do torneio.
- Ela é gente boa, vai em roda
de samba com preto, gosta de preto, fica com preto. Foi na emoção do momento, ela não é racista. Ela é louca pelo Grêmio, vai em todos os jogos,
é sócia – conta.
Dono de um mercado localizado perto da casa de Patrícia, o comerciante Marcio Batista Traslatti, de 49 anos, é outro a
sair em defesa da jovem. Ex-árbitro de futebol, também crê que a menina caiu na "empolgação".
- Ela não
é tudo isso que estão dizendo, é uma menina sem palavras. Na hora da empolgação, um puxa e os outros vão atrás. Ela foi atrás e saiu
falando besteira. Estava no lugar e hora errada. Não vamos jogar a culpa em cima - opina.
A opinião dos amigos, porém, não
é compartilhada por todos do bairro. Enquanto o grupo concedia entrevista, uma senhora, também negra, que preferiu não se identificar, mostrou indignação
com o episódio na Arena.
- Tem que valorizar onde mora, ela desvalorizou o bairro.
Na noite de sexta-feira, a casa de
Patrícia Moreira, que foi flagrada pelas câmeras do canal ESPN gritando "macaco" em direção ao goleiro Aranha, foi apedrejada. Ela se refugiou em
residências de parentes e amigos para evitar retaliação.
Intimada a depor, ela se apresentará na 4ª Delegacia de Polícia de Porto
Alegre na segunda-feira, assim como outro torcedor identificado por câmeras da Arena.
Entenda o caso
O incidente
aconteceu aos 42 minutos do segundo tempo, quando Aranha reclamou com o árbitro Wilton Pereira Sampaio, alegando ter sido vítima de xingamentos por parte da torcida. O juiz
mandou a partida seguir, mesmo sendo alertado por jogadores do Santos dos incidentes que ocorriam fora de campo.
A jovem foi afastada do trabalho no Centro
Médico e Odontológico da Brigada Militar. Era funcionária de uma empresa terceirizada e prestava serviços de auxiliar de odontologia na clínica da
polícia militar gaúcha. As imagens da torcedora ofendendo o goleiro santista começaram a circular pelas redes sociais logo após a partida.
O goleiro Aranha registrou boletim de ocorrência na 4ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre na sexta-feira. No retorno a Santos, o camisa 1 evitou se pronunciar sobre o
assunto.
Jogo de volta suspenso
As injúrias raciais proferidas por torcedores gremistas contra o goleiro Aranha
tiveram mais um desdobramento. O Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) acatou pedido da Procuradoria de Justiça Desportiva e suspendeu o jogo de volta entre as duas
equipes, na próxima quarta-feira, até que o caso seja julgado. No primeiro duelo das itavas da Copa do Brasil, os paulistas bateram os gaúchos por 2 a 0.
O julgamento ocorrerá na próxima quarta-feira. O Grêmio responderá por ato de discriminação racial por parte de torcedores,
além do arremesso de papel higiênico no gramado e atraso. O clube corre risco de exclusão na Copa do Brasil e multa de até R$ 200 mil. A denúncia se apoia
no artigo 243-G (discriminação racial) e no 213 (arremesso de objeto em campo), ambos do CBJD. O clube responde ainda ao artigo 191 por descumprir o regulamento e entrar em
campo três minutos após o horário previsto.
Advogado do Grêmio, Gabriel Vieira disse que o clube foi notificado formalmente pelo STJD na
noite de sexta.
- Nós fomos formalmente notificados pelo STJD. A partida foi suspensa e o julgamento está pautado para a mesma quarta-feira,
às 14h. Agora, estamos sentando para ler o que está acontecendo, analisando a denúncia para ver que medida tomar - afirmou à Rádio Gaúcha.
Arbitragem também denunciada
Na primeira versão, o árbitro Wilton Pereira Sampaio não incluiu na
súmula da partida menção a atos racistas na Arena. Após analisar as imagens, o juiz colocou um adendo no qual informou ter ficado ciente do caso por meio da
imprensa e que ainda fora informado por atletas do Santos. Desta forma, Pereira Sampaio, além dos assistentes Kleber Lúcio Gil e Carlos Berkenbrock, e o quarto árbitro
Roger Goulart, foram denunciados por infração aos artigos 261-A e 266, ambos do CBJD. Todos estão sujeitos a suspensões de até 90 dias e 360 dias,
respectivamente.