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15/09/2020 | 05:11 | Política

Partidos no RS divergem sobre verbas para negros em eleições de 2020 e tentam viabilizar a medida

Na última semana, ministro do STF decidiu que, a partir desta eleição, dinheiro do fundo eleitoral deve ser distribuído de forma proporcional à quantidade de concorrentes negros de cada partido

Na última semana, ministro do STF decidiu que, a partir desta eleição, dinheiro do fundo eleitoral deve ser distribuído de forma proporcional à quantidade de concorrentes negros de cada partido
Com medida, intenção é tornar mais igualitária a disputa por votos no Brasil - Juan Barbosa / Agencia RBS
Considerada mais um passo contra o preconceito e a desigualdade nas disputas eleitorais no Brasil, a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), de aplicar desde já a distribuição proporcional de recursos do fundo eleitoral para candidatos negros é alvo dúvidas no Estado. A menos de duas semanas do início da campanha, os cinco partidos com maior número de filiados no Rio Grande do Sul ainda definem como viabilizar a medida. Parte deles considera curto o prazo para adequação.
Inicialmente, segundo decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a mudança — que vale também para o tempo de propaganda no rádio e na TV — só seria adotada no pleito de 2022. No entendimento do TSE, a Constituição impede modificações no processo eleitoral a menos de um ano da data da votação.
Apesar disso, Lewandowski decidiu antecipar o prazo a partir de ação movida pelo PSOL e pela ONG Educafro, que pediam a aplicação da nova regra já em 2020. Para o ministro, a novidade “não implica qualquer alteração das regras do jogo em vigor”. Na avaliação dele, “a Corte Eleitoral somente determinou que os partidos políticos procedam a uma distribuição mais igualitária e equitativa dos recursos públicos”.
A questão é que, quando o assunto foi analisado no TSE, pelo menos um terço das siglas já havia informado ao tribunal quais seriam seus critérios de divisão do fundo e agora precisam rever a estratégia. Além disso, até o momento, não há regulamentação da medida.
No Estado, partidos como o PDT aguardam instruções da Justiça Eleitoral para definir os próximos passos.
— Sou amplamente a favor da alteração. Minha preocupação é quanto à exiguidade do tempo para a implementação. O que a gente espera é que venha uma resolução normativa do TSE que oriente os partidos de forma objetiva. No momento, há insegurança jurídica — pondera o deputado federal Pompeo de Mattos, presidente estadual do PDT.
À frente do MDB no Estado, Alceu Moreira afirma que a legenda deve discutir o assunto nesta quarta-feira (16) e que também tem dúvidas sobre como proceder. O parlamentar diz que não questiona o mérito da decisão, apenas a forma como foi tomada.
— Nosso partido está bem organizado, mas e os menores, que não têm diretórios em todos os municípios? Como vão atender à norma? A decisão é atabalhoada e cria uma grande confusão na véspera do processo. Não só isso: é uma decisão monocrática. Pode, inclusive, ser revista — ressalta o parlamentar.
De fato, a decisão de Lewandowski foi tomada individualmente e deve passar pelo plenário do STF. A expectativa é de que isso ocorra o mais breve possível. 
Presidente do PP no Rio Grande do Sul, Celso Bernardi espera para que os ministros mantenham o prazo original, imposto pelo TSE. 
— A mudança vai ao encontro da vontade dos afros, mas é impossível colocá-la em prática neste ano. Já estamos quase iniciando a campanha. Não dá mais tempo. É totalmente fora da realidade  — reforça Bernardi.
PT e PTB têm reuniões previstas para esta terça-feira (15) para definir como atender à determinação. Segundo o deputado estadual Luís Augusto Lara, que preside o PTB no Estado, “não cabe ao partido questionar a decisão do STF, apenas cumprir”. O deputado federal Paulo Pimenta, presidente do PT gaúcho, defende a mudança:
— Fomos informados pelo diretório nacional de que vamos regulamentar internamente a questão, com a ajuda da nossa assessoria jurídica. Apoiamos a decisão e vamos cumprir.
No PSOL, autor da ação, a presidente estadual da sigla, Camila Osório Goulart, afirma que “não há desculpa” para não garantir aos negros os mesmos direitos dos demais candidatos. Ela destaca que a legenda já contava com isso e que está preparada.
— Para nós, essa medida é fundamental. Infelizmente, os partidos tradicionais acabam privilegiando homens e brancos. O PSOL já tem tradição de apostar tanto nas mulheres quanto na negritude. Temos quase 30% de candidatos negros nessa eleição e não vemos dificuldade em atender à nova regra. Ao contrário, ficamos bem felizes — diz Camila.
Entenda o que foi decidido

A partir de consulta enviada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), a Corte decidiu, em agosto, que as verbas do fundo eleitoral e o tempo de propaganda no rádio e na TV devem ser distribuídos de forma proporcional à quantidade de candidatos negros de cada partido

Por entender que a Constituição proíbe mudanças no processo eleitoral a menos de um ano das eleições, o TSE definiu que isso passaria a valer apenas na disputa de 2022 e que, até lá, seria publicada a regulamentação da medida (que detalha como funcionará na prática)

Ou seja: as siglas não são obrigadas a lançar número mínimo de concorrentes negros, como já ocorre com as mulheres (que devem ocupar no mínimo 30% das vagas). O que mudou foi a forma de distribuição do dinheiro e do horário eleitoral. Cabe aos próprios postulantes declarar a sua raça à Justiça Eleitoral

Após a decisão, o PSOL e a ONG Educafro entraram com ação no STF pedindo a antecipação da medida, sob o argumento de que, frente à “violação a princípios e direitos constitucionalmente previstos”, que pregam a igualdade de direitos, “é plenamente possível admitir que os incentivos às candidaturas de pessoas negras, nos termos delimitados pelo TSE, sejam aplicados desde já”

O ministro Ricardo Lewandowski atendeu ao pedido, concluindo que a decisão não pode ser compreendida como alteração do processo eleitoral, pois não foi envolve mudança nas regras das convenções partidárias, nos coeficientes eleitorais ou na “extensão do sufrágio universal”

Para Lewandowski, a obrigação dos partidos políticos de tratar os candidatos de forma equitativa decorre do dever de resguardar o regime democrático e os direitos fundamentais e de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade”

Por ser monocrática (individual), a decisão ainda será avaliada em plenário, pelos demais ministros do STF. Por enquanto, não há data prevista para isso

Fonte: Gaúcha ZH
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