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01/12/2014 | 15:36 | Política

Laudo sobre morte de Jango é inconclusivo

Segundo perícia, dados clínicos são compatíveis com causas naturais, mas não é possível afastar a possibilidade de envenenamento

Segundo perícia, dados clínicos são compatíveis com causas naturais, mas não é possível afastar a possibilidade de envenenamento
Jango em comício na Central do Brasil, em 1964 (Foto: Arquivo Memorias Reveladas/MJ / Agência Brasil)
As interrogações que já duram quase 38 anos continuam. O laudo sobre a análise dos restos mortais do ex-presidente João Goulart não conseguiu esclarecer se o líder trabalhista foi envenenado ou vítima de um ataque cardíaco, em dezembro de 1976.
O anúncio do resultado foi feito na manhã desta segunda-feira pela ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência (SDH), Ideli Salvatti. Os filhos e netos do líder trabalhista tiveram o primeiro acesso ao laudo.
A perícia concluiu que os dados clínicos e as circunstâncias da morte de Jango são compatíveis com causas naturais. Contudo, não é possível afastar a possibilidade de envenenamento, em virtude das mudanças químicas e físicas que o corpo passou em quase quatro décadas. Os exames toxicológicos não encontraram as substâncias listadas pela perícia. Ao todo, foram testadas cerca de 700 mil substâncias.
— Nenhum medicamento tóxico ou veneno foi identificado nas amostras analisadas. Os resultados de todos os nossos exames podem concluir que os dados clínicos e as circunstancias relatadas pela esposa (Maria Thereza Goulart), são compatíveis com morte natural — afirmou o perito da Polícia Federal, Jeferson Evangelista Corrêa, que completou: — Inobstante a negativa dos resultados dos exames toxicológicos, também não é possível negar que a morte tenha decorrido de um envenenamento.
A possibilidade deste resultado já era aguardada pela família e pelo governo brasileiro, em virtude do longo tempo transcorrido desde a morte de Jango, em dezembro de 1976, na Argentina, durante o exílio. As análises foram feitas com base em amostrar coletadas durante a exumação do político gaúcho, em novembro de 2013, ou seja, 37 anos depois da sua morte.
As análises toxicológicas identificaram substâncias do cotidiano do líder trabalhista, como xampu e medicamento que ele usava para tratar uma doença coronariana. Jango era cardíaco, fumava e costumava abusar de carne vermelha e uísque, porém, o que torna plausível a hipótese de um infarto do miocárdio. No entanto, seu corpo não passou por necropsia. Sobre venenos, os peritos destacaram que, passados 37 anos, eventuais substâncias tóxicas podem ter desaparecido.
— Não há elemento científico para afirmar que houve ou não uma morte natural. Também não foi encontrada uma substância que possa indicar uma morte violenta, não podemos excluir a possibilidade de envenenamento — disse o perito cubano Jorge Perez, que acompanhou os procedimentos a pedido da família Goulart.
Na última semana, peritos brasileiros e estrangeiros estiveram reunidos no Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal, em Brasília, onde cruzaram exames toxicológicos e de gases em busca de uma substância letal que pudesse ter matado Jango, conforme suspeitas diante de denúncias de que o ex-presidente, deposto pelo golpe militar de 1964, teria sido envenenado por uma conspiração entre as ditaduras do Cone Sul.
Técnicos do Brasil, Argentina, Uruguai, Cuba, Portugal e Espanha trabalharam no laudo final com base em uma série de testes. O laboratório paulista Tasqa analisou os gases retirados do jazigo de Jango, em São Borja. Já os exames toxicológicos foram realizados pelo Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, de Portugal, e pelo Serviço Externo de Ciências e Técnicas Forenses, da Espanha. Neto de Goulart e médico, João Marcelo acompanhou as análises em Brasília.
A SDH acatou decisão da família, corroborada por liminar do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de não divulgar as fotos que constam no laudo final. São imagens diversas do corpo do ex-presidente durante a perícia. O laudo final será revisado, sendo que a Comissão Nacional da Verdade (CNV), o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça argentina, onde ocorre uma investigação da morte de Jango, receberão a versão sem imagens. O laudo completo ficará sob guarda da Polícia Federal. A ministra Ideli Salvatti negou qualquer atrito com os familiares.
— Somente em uma democracia nós realizamos uma cerimônia como essa — destacou a ministra. — O laudo é parte de um processo de investigação, ele não é a conclusão em si. A exumação faz parte do resgate da história de João Goulart — completou.
Após o resultado, a família espera que prossigam as investigações sobre a morte de Jango, dentro de uma ação do MPF. Depoimentos de agentes da repressão, incluindo estrangeiros como Frederick Latrash e Michael Townley, e acesso aos arquivos americanos ainda não desclassificados são passos sugeridos.
— Sabíamos que poderíamos chegar a esse resultado e sabemos que vamos continuar lutando — afirmou João Vicente Goulart, filho de Jango.
O herdeiro insiste na importância de o governo brasileiro ouvir os depoimentos dos agentes americanos Latrash e Townley. O laudo final também será encaminhado para autoridades argentinas com a intenção de ouvir os dois.
— Cabe ao Ministério Público, em nome não só de Jango, mas em nome da democracia brasileira, que eles continuem e transformem a investigação em ação cautelar pedindo a oitiva dos agentes americanos que até hoje não foi feita e que outros países já fizeram — reforçou João Vicente. 
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