Logomarca Paulo Marques Notícias

06/01/2024 | 04:55 | Esporte

Morre Zagallo, um dos maiores nomes da história do futebol brasileiro e mundial

Com 92 anos, o tetracampeão do mundo teve sua morte confirmada por meio de postagem em seu perfil oficial, destacando o "ídolo gigante" que foi

Com 92 anos, o tetracampeão do mundo teve sua morte confirmada por meio de postagem em seu perfil oficial, destacando o
Zagallo venceu como jogador, técnico e coordenador. - RODOLFO BUHRER

O Velho Lobo, o Formiguinha, o Senhor Copa, o Apóstolo do 13, todos morreram nesta sexta-feira (5). Encerrou-se, à noite, uma das trajetórias mais vitoriosas da história do futebol brasileiro. Foram tantas taças, tanta relevância para o esporte que, para pavimentar essa caminhada opulenta, parecia necessário reunir um grupo de craques. Mas os quatro apelidos recém-citados, o leitor bem sabe, pertenciam ao mesmo homem: Mário Jorge Lobo Zagallo. 

A morte do ex-jogador e técnico da seleção brasileira, aos 92 anos, foi divulgada por meio de postagem em seu perfil oficial no Instagram. "Um pai devotado, avô amoroso, sogro carinhoso, amigo fiel, profissional vitorioso e um grande ser humano. Ídolo gigante. Um patriota que nos deixa um legado de grandes conquistas", diz a publicação.

Homem de choro fácil e superstições anedóticas, Zagallo aliou inteligência e patriotismo para sagrar-se o único tetracampeão mundial de futebol. Ninguém no planeta ganhou tantas Copas quanto ele: em 1958 e 1962, venceu a competição como um moderno ponta-esquerda; em 1970, como treinador de uma Seleção quase imbatível; em 1994, como coordenador técnico no estilo que o consagrou nos últimos tempos: uma espécie de tio gente-boa, ora bonachão ora inflexível, que fazia os brasileiros balançarem a cabeça e comentarem, sorrindo:

– Esse Zagallo...

Foi assim no episódio do "vocês vão ter que me engolir", em 1997, quando ele voltou a treinar a Seleção e ganhou a Copa América sob críticas de parte da imprensa. Seus arroubos de impaciência eram frequentes quando alguém, mais do que mexer com Zagallo, inventava de mexer com o Brasil.

Em 1958, na Copa da Suécia, o ponta-esquerda voltava de um treino quando percebeu que, na frente do hotel, todas as bandeiras tremulavam lado a lado, menos a brasileira. Foi pedir satisfação na gerência e ficou furibundo ao descobrir que haviam colocado a bandeira de Portugal no lugar da verde-amarela. Sapateou até colocarem a certa.

— Achavam que a nossa capital era Buenos Aires! Por isso que eu digo: o futebol fez muito mais pelo Brasil do que qualquer embaixada — disse Zagallo à revista Aventuras na História.

Naqueles tempos, final dos anos 1950, a crônica esportiva o chamava de Formiguinha. Veloz e franzino, revolucionou o esquema tático ao recuar da ponta-esquerda para ajudar na marcação e povoar o meio-campo. Não era brilhante, mas trabalhava feito formiga na grama — e, em uma Seleção com Pelé, Garrincha, Didi e Nilton Santos, não era de outro brilhante que o time precisava.

Em seus 92 anos de vida, o alagoano Zagallo talvez nunca tenha sido o melhor. Mas sempre soube o que fazer para tornar-se o maior.

A vida do único tetracampeão do mundo

A graúda vida de Zagallo contrasta com a miúda Atalaia, cidade nos arredores de Maceió, onde nasceu em 9 de agosto de 1931. Com meses de vida, foi com a família para o Rio de Janeiro, onde fincou raízes e fez história como jogador, técnico e personagem. Criou-se jogando bola pelas ruas da Tijuca, bairro da zona norte da capital Fluminense. 

O desejo do pai do menino Mário Jorge era que o filho seguisse uma carreira diferente. A visão nos anos 1940 era que aqueles que ganhavam a vida chutando uma bola era malandros e vagabundos. Contra a vontade paterna, Zagallo perseguiu o seu sonho. Antes de criar uma relação mais íntima com as principais camisas do futebol carioca, jogou nas divisões inferiores do América, então dono de seis títulos estaduais. 

A Seleção Brasileira ainda não vestia a camisa amarela pela qual Zagallo teria uma paixão visceral por seis décadas quando o relacionamento começou. Ele era uma das quase 200 mil almas desoladas que testemunharam o Maracanazo. Paramentado com uniforme verde-oliva, bota e capacete, trabalhou na segurança da partida decisiva da Copa do Mundo de 1950, quando o Brasil perdeu por 2 a 1 para o Uruguai, no Maracanã. Decisões como aquela se tornariam corriqueiras em sua carreira, em geral com resultados animadores. Dos sete Mundiais em que trabalhou, em cinco alcançou a final. 

Seis meses antes daquele 16 de julho, chegou ao Flamengo para fazer a uma mudança que abriria o caminho para o surgimento de uma lenda.  Deixou de vestir a camisa 10 para ter o número 11 sobre as costas. Como ponta-esquerdo se via como mais chances de conseguir um lugar na Seleção Brasileira. A versatilidade e o fôlego o transformaram em um jogador valioso, embora menos brilhante que outros nomes da sua geração.   

Pelo lado esquerdo do ataque, fechando o meio-campo, venceu as duas Copas que disputou (1958 e 1962). No final da Copa da Suécia, com vitória por 5 a 2 sobre os donos da casa, foi dele o quarto gol brasileiro, após pegar sobra em chute de Didi.

— Dividi a bola com o defensor, mas fiquei com a bola, mesmo que ele fosse muito mais forte. Fiquei na frente do goleiro, chutei embaixo dele, no canto esquerdo — relata Zagallo, no livro Goal, publicação da Fifa em homenagem a todos os jogadores que foram às redes em uma decisão de Mundial. 

Surge o Velho Lobo 

Logo depois de ter colocado a mão na Jules Rimet pela primeira vez,  trocou o Flamengo pelo Botafogo, mesmo que propostas mais vantajosas tenham sido oferecidas. No clube de General Severiano, desfilou seu futebol ao lado de nomes como Garrincha, Nilton Santos, Manga, Paulistinha, Amarildo e Quarentinha, time que ficou conhecido como a Selefogo.  Dois anos depois do bi no Chile, a Formiguinha deixou o gramado para iniciar a sua vida como Velho Lobo.

Seis anos depois, aos 39 anos, Zagallo se tornou o técnico mais novo a assumir o comando da Seleção Brasileira para a Copa do Mundo de 1970. Uma escolha tão controversa quanto exitosa. De temperamento forte e de posição política clara, o gaúcho João Saldanha foi demitido por não ter cedido aos desejos do presidente Médici de ver o centroavante Dario no time brasileiro.

A escolha de Zagallo foi respaldada por um título da Taça Brasil e dois Campeonatos Cariocas pelo Botafogo. Detratores dizem que ele assumiu um supertime estruturado. Defensores argumentam que suas mudanças foram cruciais para que o mundo visse uma das equipes mais brilhantes surgidas no esporte.

Entre  seus méritos está montar uma equipe que juntava os talentos de Gérson, Rivellino, Jairzinho, Tostão e Pelé. Outra mudança significativa foi o deslocamento de Piazza para a zaga. Desse forma, conseguiu escalar  os melhores jogadores do país.

O momento mágico durou somente o tempo que devia durar para que o encanto perdurasse pela eternidade. Quatro anos depois, na Copa da Alemanha, restou apenas a moldura da equipe do tricampeonato. A fotografia sofreu inúmeras modificações para 1974. Antes da partida contra a Holanda, minimizou a força do "Carrossel Holandês".   

— Holanda é muito tico-tico-no-fubá, que nem o América dos anos 50 —disparou.

Em um jogo ríspido, o Brasil perdeu por 2 a 0 e viu a chance do tetra virar pó.

A parceria com Parreira

Demoram mais 20 anos para o tetra se concretizar. No período, as decepções do título moral em 1978, a tragédia de 1982, a desilusão dos pênaltis 1986 e os três zagueiros de 1990 se acumularam. Em 1991, Zagallo retornou à Seleção para ser o auxiliar técnico de Carlos Alberto Parreira no reencontro de uma parceria iniciada em 1970.

Na campanha do tri, Parreira era auxiliar de preparação física. Quatro anos depois, era o responsável principal pelo fôlego dos jogadores. Na sequência, os dois desbravaram o futebol do Oriente Médio. Lá, trabalharam nas seleções de Kuwait, Emirados Árabes e Arábia Saudita.

Nos quase três anos em que estiveram juntos no comando do Brasil, enfrentaram uma campanha de Eliminatórias conturbada, com direito da primeira derrota brasileira em torneios classificatórios para a Copa do Mundo. A solução para os problemas foi reintegrar Romário. O Baixinho entrou em atrito com a comissão técnica após amistoso contra a Alemanha, em amistoso em Porto Alegre no final de 1992.

Com um futebol considerado pragmático e criticado por boa parte da imprensa e dos torcedores, Parreira e Zagallo levaram a Seleção ao inédito tetracampeonato. Uma nova reedição da dupla ocorreu entre 2002 e 2006, sem o mesmo sucesso, com o Brasil sendo eliminado pela França nas quartas de final da Copa da Alemanha.    

Copa de 1998

Depois da Copa dos Estados Unidos, Parreira deixou o cargo, e Zagallo assumiu como técnico do time nacional pela segunda vez. Foram quatro intensos. O Velho Lobo teve a chance de dar ao futebol brasileiro a medalha de ouro em Jogos Olímpicos, mas caiu nas semifinais para a Nigéria.

Às vésperas dos Jogos de 1996, protagonizou uma comemoração tão marcante quanto o "vocês vão ter que me engolir". Em amistoso contra a África do Sul, o Brasil, para alegria do técnico Clive Barker, os Bafana Bana abriram 2 a 0. Na comemoração, o treinador sul-africano invadiu o gramado simulando um aviãozinho. Nos minutos finais, a Seleção conseguiu a virada, e com Zagallo ninguém provoca o Brasil. Ele invadiu o campo também imitando um avião.

A  campanha no Mundial ficou marcada por dois momentos. O primeiro foi o incentivo do treinador aos jogadores antes da disputa por pênaltis na semifinal contra a Holanda. A outra, a convulsão sofrida por Ronaldo antes da decisão contra a França.

Fonte: GZH
Mais notícias sobre ESPORTE